7.ª Conferência Internacional sobre Síndrome de Angelman

Nos dias 15 a 17 de setembro, em Viena, Áustria, teve lugar a 7ª Conferência Internacional para a Síndrome de Angelman organizada pela Angelman Syndrome Alliance (ASA). Os primeiros dois dias foram dedicados aos mais recentes avanços na investigação por cientistas de toda a parte do mundo.

A primeira apresentação esteve a cargo de Ype Elgersma (Erasmus MC, Holanda) que anunciou a criação de um novo ratinho que mimetiza o genótipo da megadeleção, de modo a representar a causa genética mais frequente nos pacientes com síndrome de Angelman. O fenótipo deste ratinho será descortinado no futuro. Stormy Chamberlain (Roche, Suíça) fez um resumo do seu trabalho sobre a regulação do gene UBE3A e do seu silenciador (UBE3A antisense) usando modelos celulares baseados em células estaminais. Hanna Vihma (UNC, EUA) falou-nos de um novo composto bastante promissor como abordagem terapêutica que bloqueia o silenciador do gene UBE3A, aumentando assim os níveis de UBE3A no cérebro.

Vários trabalhos incidiram na função do gene UBE3A em processos celulares como a ubiquitinação, por Ugo Mayor (Univ. do País Basco, Espanha), a degradação de proteínas, por Mattijs Punt (Erasmus MC), e a formação e regulação das sinapses nos neurónios, pelo português Ramiro Almeida (Instituto de Biomedicina, Aveiro). Nesta série de apresentações é de realçar a descoberta de Ugo Mayor de que as proteínas-alvo da UBE3A não são necessariamente degradadas como inicialmente antecipado, abrindo a porta para um novo paradigma de investigação a explorar no futuro.

Hanoch Kaphzan da Univ. de Haifa, Israel, falou da importância das aplicações bioinformáticas e da computação para decifrar como a síndrome de Angelman afeta o desenvolvimento do cérebro. Ele também demonstrou que compostos que ajudam melhorar o metabolismo celular tem efeito benéfico na sintomatologia da doença.

Os modelos humanos foram representados pela equipa portuguesa do Instituto Superior Técnico que apresentou o progresso dos seus projetos usando células estaminais de pacientes com Angelman. Evguenia Bekman explicou como mini-cerebelos feitos em laboratório podem ajudar a compreender as dificuldades de desenvolvimento cognitivo e motor dos doentes. Carina Maranga mostrou a criação de uma nova linha de células estaminais de doente com megadeleção classe II e ainda os resultados do seu estudo epidemiológico das famílias de Anjos em Portugal (que várias famílias associadas à ANGEL responderam). Por fim, Adriana Vieira apresentou um novo projeto em que se corrigiu uma mutação no gene UBE3A através de edição genética.

Não menos importante, investigadores de doenças do espectro do autismo, síndrome de Christianson e síndrome de duplicação do cromossoma 15 (Dup15q) apresentaram os seus trabalhos. A comparação entre síndromes raros pode ajudar a compreender melhor aspectos patológicos da síndrome Angelman e inspirar novos caminhos de investigação.

O último dia da conferência foi dedicado aos familiares e amigos de Anjos.

Os vencedores das bolsas de investigação científica ASA 2022 apresentaram o que planeiam fazer nos seus projetos: o grupo português liderado por Simão T. da Rocha com Evguenia Bekman tenciona criar um portfólio de células estaminais que seja representativo de todas as causas genéticas dos pacientes com Angelman e usar estas novas linhas celulares para estudar a disfunção do cerebelo em Angelman; a equipa italiana liderada por Ilaria Tonazzini e Laura Baroncelli (CNR, Itália) pretende desenvolver nanopartículas que transportem ASOs até ao cérebro por administração intranasal e desenvolver um biomarcador baseado em métodos de imagem não invasivos para monitorizar a função cerebral de doentes de Angelman. Ambos estes projetos visam avançar o conhecimento da síndrome de Angelman e facilitar terapias futuras.

Doesjka Hagenaar (Erasmus MC) sensibilizou-nos para o stress acrescido que pais e cuidadores de doentes sentem. Também vimos como as técnicas alternativas de comunicação se podem tornar “a voz” dos doentes com Angelman (Alberto Velez-van-Meerbeke e Michaela Zöbl). Christel Kannegießer-Leitner, mãe de um Anjo de 34 anos e médica, apresentou a possibilidade de canabidiol (CBD) ser usado como antiepilético, sempre com o acompanhamento de um médico e as devidas precauções, em particular usando o extrato da planta (e não compostos sintéticos) e assegurando a qualidade do produto.

Ao nível dos ensaios clínicos, Sebastian Holst (Roche) expôs os principais resultados do estudo observacional FREESIAS. Tal como Karen Heus (Erasmus MC), o foco foi no distúrbio do sono e recomendações de boas práticas e técnicas para o sono. Rob Komorowski (Ionis) comentou os avanços do estudo AS CSF em que se deteta os níveis de UBE3A no líquido cefalorraquidiano para servir de biomarcador de terapias. Representantes do ensaio TANGELO (Roche), do ensaio HALOS (Ionis Pharmaceuticals) e da PTC Therapeutics divulgaram em que fase estão os seus ensaios clínicos usando ASOs. Por razões explicitadas pelas duas apresentadoras, os resultados só poderão ser anunciados no final do ensaio para não perturbar o normal andamento do estudo.

Em resumo, este encontro de cientistas e familiares de Anjos provou-se um ambiente extremamente rico em ideias e interações numa comunidade aliada na busca por conhecimento, terapias, cooperação e interajuda.

 

Por Adriana Vieira e Carina Maranga
Investigadoras, Membros da equipa portuguesa vencedora da Bolsa ASA 2021

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